quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

A Grande Corrente



Caminhando pela rua movimentada, Clarinha pensava em como fazer para conseguir arrumar algum alimento para levar para casa.

Estava cansada e sem ânimo. Ninguém a tinha ajudado. Já era tarde.

Lembrou-se da mãezinha doente que não estava podendo trabalhar e sustentar a casa. O pai já havia desencarnado.

Clarinha estava há dias sem ir à escola. Como eram as duas sozinhas, tinha que fazer companhia à mãe. Precisava atendê-la em suas necessidades, dar-lhe água, fazer um chá, ministrar-lhe o remédio.

Nesse dia, estavam sem nada em casa. Não tinham o que comer e até o remédio tinha acabado. Clarinha precisava buscá-lo na farmácia.

Depois de muito pensar, Clarinha decidiu que iria para a rua pedir a ajuda das pessoas. Havia muita gente generosa que não deixaria de socorrê-la nessa emergência.

Lembrou-se de uma senhora conhecida, muito boa, tão pobre quanto elas, que talvez pudesse fazer companhia à sua mãe.

Ajeitou as cobertas da mãe e avisou-a de que teria de sair um pouco.

— Vá, minha filha. Não se prenda por minha causa. Você não tem saído de casa e isso me preocupa.

Dona Maria residia ali perto. Clarinha foi orando para que a senhora estivesse em casa.

A senhora abriu a porta, sorridente. Clarinha explicou-lhe a situação e perguntou:

— A senhora poderia fazer companhia à mamãe por algumas horas? Preciso sair e não posso deixá-la sozinha!

— Sem dúvida, Clarinha. Irei imediatamente. Pode fazer o que precisa sem pressa. Ficarei com sua mãe o tempo que for necessário.

Agradecendo à senhora, Clarinha tomou o rumo da cidade. Apesar de não ser acostumada a mendigar, a menina estava resolvida a solicitar a ajuda das pessoas.

Contudo, não era fácil. Cheia de vergonha, munindo-se de coragem, Clarinha começou a abordar os transeuntes:

— Uma ajuda, por favor!

Mas todos passavam correndo, apressados, sem tempo para parar; muitos respondiam mal, deixando-a mais envergonhada ainda; outros a tratavam com desprezo, alguns com indiferença e, ainda outros, nem a viam.

Com o coração amargurado, Clarinha segurava a vontade de chorar.

Olhava mães que passavam com seus filhos, bem-vestidos, alegres, satisfeitos. As crianças tinham doces nas mãos ou chupavam sorvetes que pareciam deliciosos, e Clarinha sentia uma dor muito grande no íntimo.

Ela nunca tinha podido passear assim com sua mãe, sempre trabalhando para comprar o necessário para casa. Agora, nem isso. Não tinham o que comer e até o pão lhes faltava.

As horas tinham passado e a menina estava exausta e faminta.

Clarinha resolveu voltar para casa. Passou na farmácia, pegou o remédio da mãe, que o farmacêutico lhe vendeu fiado, e tomou o rumo de casa.

No caminho, Clarinha suplicava a ajuda de Jesus. O Natal estava se aproximando e a cidade mostrava-se tão bonita, cheia de enfeites coloridos e luzes, todavia ela sentia-se triste.

“Ajude-nos, querido Jesus! O senhor que também era tão pobre, que nasceu numa estrebaria e teve por berço uma manjedoura, socorra-nos! Não peço por mim, mas por minha mãezinha que está tão doente. Que ela sare e possa voltar a trabalhar e a sorrir. Que pelo menos para ela não falte o alimento, para que se levante da cama e possa andar.”

Como já estivesse escuro e a rua deserta, Clarinha deixou que as lágrimas corressem pelo seu rosto, lavando-lhe a alma.

Ao chegar a casa, sentiu um cheirinho bom de comida. Estranhou.

Estava tudo arrumado e limpo. Correu para o quarto, preocupada em ter deixado a mãe tanto tempo.

Dona Maria tinha acabado de dar o jantar para a enferma, que mostrava ar alegre e risonho. Clarinha desculpou-se:

— Dona Maria! Demorei demais e abusei da sua bondade. Desculpe-me.

Com sorriso largo e satisfeito, a senhora respondeu:

— Não se preocupe, minha filha. Adorei passar a tarde aqui com sua mãe. Demos boas risadas lembrando fatos do passado. E você, como foi? Conseguiu fazer o que precisava?

— Não, dona Maria. Não consegui fazer o que planejei. Só trouxe o remédio da mamãe. Mas, como foi que a senhora fez esta sopa? Não tínhamos nada em casa!

A senhora, vivida e experimentada, que tinha entendido o drama da família e a preocupação da menina, sorridente, tranquilizou-a:

— Clarinha, eu sou muito pobre, porém tenho bons amigos. Mandei recado a algumas pessoas e logo o resultado começou a surgir. Venha ver!

Dona Maria levou a menina para a cozinha e, num canto, havia uma grande caixa com alimentos: arroz, feijão, óleo, farinha, sal, café, macarrão e muito mais. Ela viu, com surpresa, que tinha até bolachas!...

Não contendo as lágrimas, Clarinha abraçou a amiga, agradecendo-lhe pelas dádivas. A senhora respondeu, comovida:

— Agradeça a Jesus, Clarinha. Foi ele que colocou amor no coração das pessoas que nos ajudaram.

Abraçando a senhora, a menina concordou:

— Sei que foi Jesus, dona Maria. Ele atendeu às minhas preces. Porém, foi através das suas mãos que ele nos socorreu. Obrigada.

Tudo mudou naquela casa depois desse dia. Os amigos de dona Maria, passaram a visitá-las e se tornaram seus amigos também.

No dia de Natal, a mãe de Clarinha já estava curada e trabalhando. Tudo tinha voltado à normalidade.

Reuniram todas as famílias e resolveram fazer uma grande festa para comemorar o nascimento de Jesus. E, como não poderia deixar de ser, elas homenagearam o Divino Aniversariante, ajudando outras pessoas necessitadas que, no momento, passavam por dificuldades.

E Clarinha entendeu que tudo na vida tem que ter amor. Que amando as pessoas, não ficamos sozinhos. Que saindo de dentro de nós mesmos e passando a dividir nossos problemas, recebemos ajuda, tanto quanto chegará o momento em que poderemos também socorrer com amor a outros, numa grande corrente de fraternidade e doação ao próximo.


Meimei

(Recebida por Célia Xavier de Camargo, em Rolândia-PR, em 29 de novembro de 2005.)

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